Percebi que estava tudo errado, que estava tudo mal, que algo tinha acontecido.
- Ele não... - gaguejei, levantando-me.
- Lamento... - disse o médico.
A minha mãe desatou a chorar desalmadamente e sentou-se, perdendo as forças. Eu simplesmente deixei-me ficar em silêncio.
As lágrimas caíam gentilmente pela minha cara sem eu conseguir falar, queixar-me, gritar. Nem o meu choro tinha som. Aquela simples palavra caiu-me mal como tudo.
Senti os braços quentes e fortes de Tom rodearem-me. Agarrei-me a ele com todas as mais pequenas forças que me restavam.
" Porque é que as coisas são tão injustas? ".
- Porquê? O que aconteceu? - perguntei ao médico.
- Como a menina sabe, era uma daquelas operações de alto risco. Estivémos durante muito tempo a tentar perceber por onde íamos começar a cortar, sem danificar nada. Quando conseguimos fazer um corte suficientemente grande e estávamos quase a alcançar o aneurisma, ele rebentou.
Continuei a chorar sem reacção, perdida.
Olhei para o Tom. Ele olhava-me, triste. Colocou a sua mão na minha face e puxou-me para ele outra vez.
As minhas pernas fraquejaram. Sentia-me fraca, inútil. Mais do que nunca. Molhei sem intenção a t-shirt do Tom ao chorar tanto agarrada a ele.
Quando as coisas acalmaram, fomos para casa.
- Entra - disse a Tom.
Dei-lhe a mão e fi-lo entrar na minha casa.
A minha mãe também já não tinha forças para chorar, para dizer o que quer que fosse.
Sem uma palavra, entrou em casa, pousou a mala e foi fazer o jantar.
Subi ao piso de cima, sempre a dar a mão ao Tom.
Atirei-me para cima da cama. Deitei-me de lado e deixei-me ficar com a cabeça colada na almofada.
Tom deitou-se do meu lado. Colado a mim, afagou-me os cabelos e depois envolveu a minha cintura com o seu braço. Deixei-me ficar. Nenhum de nós se mexeu, nenhum de nós soltou uma palavra.
Deixei-me consumir em pensamentos, em memórias. Não queria acreditar que o meu pai se tinha ido...para sempre.
" Amanhã vais acordar aqui ao lado do Tom, com o teu pai a dizer-te que são horas de ir para a escola. Por falar em escola... "
- Tom, tu faltaste à escola hoje - disse, lembrando-me.
- Faltei só a Inglês. Fui a educação física de manhã, foi por isso que só cheguei a meio da manhã. Deixa lá, foi só Inglês. Eu safo-me na disciplina. - respondeu.
- E daí? Não devias faltar à escola. Muito menos por minha causa.
- Achas que te deixava sozinha?
- Não estava sozinha, estava com a minha mãe.
- Não interessa. Não te ia deixar.
" Ou é perfeito, ou é uma grande imitação! ".
Ficámos ali mais um tempo.
A minha mãe bateu à porta do quarto. Abriu-a um bocado e disse com uma voz rouca e a fraquejar:
- O jantar está pronto. Jantas connosco, Tom?
- Por favor... - disse baixinho, fitando-o.
- Está bem, eu janto. Obrigado. - respondeu Tom.
Descemos e sentámo-nos à mesa.
Tom foi comendo devagar enquanto eu e a minha mãe só enrolávamos o garfo no esparguete e mal o levávamos à boca.
- Desculpem, mas...é melhor vocês comerem qualquer coisa, mesmo que seja pouco. Depois ficam sem forças - disse Tom, interrompendo o silêncio.
- Tens razão - concordei.
O meu tom de voz saía fraco, por mais que eu quisesse gritar.
A todo o custo, fui comendo até acabar quase tudo o que tinha no prato. Tom esperou por mim, sentado na mesa. A minha mãe quase nem comeu. Levou o seu prato para a cozinha quase cheio.
Ao subir de novo ao quarto, Tom deitou-se na cama e eu deitei-me por cima. Ele abriu as pernas e eu fiquei deitada com a cabeça no seu peito.
- Dorme cá - disse-lhe.
- A tua mãe não se importa? - perguntou.
- Achas que isso a incomoda agora? Ela tem mais em que pensar. O meu pai acabou de...de nos deixar. E a tua mãe? Importa-se?
- Não, acho que não. Eu ligo-lhe.
Ligou à sua mãe e esta disse que ele podia ficar.
Vesti o pijama e Tom deitou-se de boxers. Deitei-me ao pé dele. Voltou a envolver a minha cintura com o seu braço, apertando-me contra si. Afagou-me de novo os cabelos e beijou-me. Deixei-me adormecer.
sexta-feira, 22 de agosto de 2008
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário